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quinta-feira, 19 de julho de 2012


Brasileiro concorre ao prêmio de melhor professor dos EUA

Alexandre Lopes foi eleito o melhor entre 180 mil professores da Flórida.
Natural de Petrópolis (RJ), ele se especializou em ensinar crianças autistas.

Ana Carolina MorenoDo G1, em São Paulo

O brasileiro Alexandre Lopes, que dá aula para crianças especiais na Carol City Elementary, na Flórida
(Foto: Reprodução/Macys's)

Um brasileiro de 43 anos, natural de Petrópolis, no Rio de Janeiro, foi eleito na última quinta-feira (12) o melhor entre os mais de 180 mil professores da rede estadual de ensino da Flórida, nos Estados Unidos. Além de prêmios em dinheiro, um carro, uma viagem a Nova York, um anel de ouro e um treinamento espacial na Nasa, Alexandre Lopes, que emigrou do Brasil em 1995, agora é candidato ao título de melhor professor dos Estados Unidos.

A etapa nacional da disputa fica aos cuidados do Departamento Nacional de Educação do governo federal. Lopes já tem presença garantida no evento de divulgação do resultado, em maio de 2013 na Casa Branca, em Washington, com a presença do presidente americano. Até lá, ele vai viajar pelo estado onde mora dando palestras para outros professores sobre sua metodologia na sala de aula. Doutorando da Universidade Internacional da Flórida, ele se especializou na educação especial para a primeira infância e, há oito anos, trabalha na escola Carol City Elementary, em Miami.

O brasileiro leciona para dois grupos de 12 e 13 crianças com idades de três a cinco anos, na idade considerada nos Estados Unidos como pré-escolar. Parte dos alunos é autista e, como a Carol City Elementary fica em uma região de baixo poder aquisitivo, a maioria dos estudantes pertence a minorias dentro da sociedade americana. Alguns ainda são filhos de imigrantes e não têm o inglês como idioma nativo.

É uma inclusão total e irrestrita, da maneira que eu gosto, com alunos deficientes, imigrantes, minorias... Como eu acho que a sociedade deveria ser"

Alexandre Lopes, eleito o
melhor professor da Flórida

"É uma inclusão total e irrestrita, da maneira que eu gosto, com alunos deficientes, imigrantes, minorias... Como eu acho que a sociedade deveria ser", conta. Lopes considera sua abordagem "holística" e afirma que se envolve em todos os aspectos da vida de seus "aluninhos", como gosta de se referir às crianças que ensina, tanto da parte acadêmica quanto da emocional e da social. Para o brasileiro, isso significa incluir todos os membros mais próximos da família no processo escolar, muitos deles ainda se adaptando à notícia de que seus filhos são autistas.

Aceitando a diversidade
Na sala de aula do brasileiro, porém, todos são iguais. "Eu não diferencio meus alunos. Procuro ser consistente para fazer com que meus alunos com autismo tenham os outros como modelo, e para fazer com que meus outros alunos aceitem todas as diferenças que existem na nossa sociedade", explica Alex, como é conhecido pelos alunos e colegas de trabalho. Suas técnicas variam de acordo com o conteúdo das aulas. Segundo ele, música e dança são dois elementos que predominam durante as atividades, mas a adoção da tecnologia também ajuda os pequenos estudantes a se expressarem.

Entre os equipamentos está uma tela que reproduz, ao toque de um botão, mensagens pré-gravadas na voz dele ou de um estudante. O instrumento é usado pelos alunos autistas para que eles possam comunicar o reconhecimento dos símbolos, um processo que, segundo Lopes, acontece nestas crianças de maneira diferente das demais.

 Lopes usa tecnologia, instrumentos e música para transmitir conhecimentos a crianças de três a cinco anos (Foto: Reprodução/Macys's)

Para aprender a construir palavras, os aluninhos usam blocos de madeira que representam cada letra e os unem e separam para formar sílabas, sempre atentos aos sons das palavras para compreender a relação entre as rimas e a formação das palavras com grafia parecida. "Isso serve para tirar a palavra do abstrato e torná-la uma coisa concreta, o que é muito importante para crianças com deficiência", explica.

Alexandre também digitaliza as páginas de livros, ocultando as frases escritas para reescrever a história a partir das imagens de forma coletva e, assim, conseguir tirar das crianças a linguagem construída durante as demais atividades.

A imigração, o atentado e a mudança
O início da vida adulta de Lopes não poderia ser mais distante de seu cotidiano atual, trabalhando sete horas por dia, cinco dias por semana, com um intervalo de 30 minutos para o almoço. No início da década de 1990, o hoje melhor professor da Flórida trocava Petrópolis pela capital fluminense para estudar produção editorial na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Naquela época, ele havia abandonado o sonho de criança de ser professor, já que sempre ouvia relatos de como a carreira exigia muito e pagava pouco.

Ele conta que arrumou um emprego na Pan American Airways para pagar o aluguel no Rio de Janeiro. Depois de formado, o então bacharel se apaixonou e decidiu se mudar para os Estados Unidos em julho de 1995. "Mas eu jamais deixei o Brasil. A vida me trouxe aos Estados Unidos, mas tenho muito orgulho da minha origem e de ser quem sou", diz.

Durante vários anos, Lopes seguiu trabalhando como comissário de bordo para várias companhias aéreas americanas, onde fazia traduções de inglês, português e espanhol nas rotas da América Latina. Mesmo com os benefícios e as muitas viagens que pôde fazer pelo mundo, ele afirma que sentia falta de estudar. "Eu queria algo que fosse um pouco mais recompensador, mas era difícil porque tinha que pagar as minhas contas", lembra.

Jamais deixei o Brasil. A vida me trouxe aos Estados Unidos, mas tenho muito orgulho da minha origem e de ser quem sou"

Alexandre Lopes

Após os atentados terroristas de 11 de setembro de 2001, sua empresa ofereceu pacotes de benefício a quem aceitasse se afastar do emprego e abrir mão do salário. Lopes, já com mais de 30 anos de idade, aproveitou a chance para buscar uma nova formação. Segundo ele, sua ideia original era se tornar professor de línguas estrangeiras, mas uma conselheira vocacional sugeriu, além do curso de educação, um curso introdutório em educação especial na primeira infância.

"Me apaixonei pela área e minha professora se apaixonou pelo meu trabalho. Ela me recomendou para uma bolsa de mestrado na Universidade de Miami", explica o professor, que foi aprovado no processo seletivo com bolsa integral e, assim que completou seus créditos e estágios obrigatórios, recebeu o convite para iniciar uma turma de educação inclusiva na Carol City Elementary, onde está desde 2005, com um salário mais baixo do que recebia quando era comissário de bordo.

Lopes agora equilibra o trabalho com a pesquisa de doutorado na Universidade Internacional da Flórida, onde também foi selecionado para estudar com bolsa integral, e o Projeto Rise, uma iniciativa americana em nível federal que estimula a formação continuada de professores de escolas com população carente no país.

Alex foi eleito o melhor professor da Flórida na última quinta-feira (12); à direita, ele recebe um beijo de seu pai, Enir Lopes, que viajou de Petrópolis a Miami para a cerimônia (Foto: Reprodução/Macys's)

Eleito entre mais de 180 mil docentes
Durante mais de seis meses, Lopes passou por uma série de longas e trabalhosas etapas para conquistar o título de melhor professor de toda a rede estadual da Flórida. O processo começou com uma votação entre os próprios colegas da escola em que ele trabalha, na região centro-norte do condado de Miami, o quarto maior dos Estados Unidos, com 25 mil docentes. Ele então preparou um material por escrito com dezenas de páginas, no qual explicava sua filosofia educacional, suas motivações e sua metodologia de ensino.

O documento foi avaliado na sua região e ele foi selecionado como um dos cinco finalistas, que receberam visitas em suas salas de aula de uma comissão com 13 examinadores e participaram de entrevistas. Lopes venceu a disputa e, no início do ano, passou a concorrer ao posto de melhor professor do condado. O resultado, também favorável ao professor petropolitano, saiu em fevereiro deste ano, junto com um carro 0 km, prêmios em dinheiro e uma bolsa de estudos, à qual ele abriu mão por já ter uma no doutorado.

A etapa estadual, que tem patrocínio da rede de lojas de departamento Macy's, exigiu novos artigos, visitas à sala de aula e entrevistas, além do envio de um vídeo apresentando o trabalho na escola e um encontro de três dias na cidade de Orlando com os mais de 70 professores dos condados e distritos especiais da Flórida.

Essas crianças são filhas desses indivíduos, mas elas também são parte da nossa sociedade, é injusto que deixemos esses pais sozinhos com o grande desafio que enfrentam"

Alexandre Lopes

Na entrevista final, o brasileiro lembrou aos examinadores que, naquele dia de junho, o planeta Vênus estava transitando em frente ao Sol, um fenômeno que só se repetirá daqui a um século. "Eu disse a eles que, quando isso acontecer, eu não vou estar mais aqui, meus aluninhos não vão estar mais aqui, mas a sociedade ensinada por eles e pelo meu ensino, sim. Depois disse a mim mesmo: 'que resposta mais tola!' Voltei para casa achando que não venceria", afirmou.

Lopes estava errado, e seu nome foi anunciado como melhor professor do estado na última quinta-feira. Assim como as exigências da competição, as recompensas da etapa estadual também são maiores, e incluíram surpresas e um prêmio de US$ 5 mil (mais de R$ 10 mil) aos cinco finalistas, além de US$ 10 mil (mais de US$ 20 mil) ao grande vencedor.

A fama, o dinheiro e as regalias que tem recebido nos últimos meses, porém, são honras menores para ele. "Eu tive uma vida muito feliz, de muitas alegrias. Mas as alegrias que eu encontro com o sucesso dos meus alunos não se comparam com nada que eu já experimentei", afirmou Lopes, que diz ter uma admiração especial pelo pais de alunos com deficiência. "Essas crianças são filhas desses indivíduos, mas elas também são parte da nossa sociedade, é injusto que deixemos esses pais sozinhos com o grande desafio que enfrentam."

04/07/2012 06h30- Atualizado em 17/07/2012 13h58

Estudante cego de SP vai cursar ciência da computação nos EUA

Maurício Almeida, de 18 anos, foi aprovado pela Universidade de Michigan.
Ele abriu uma empresa e traduz jogos na internet para deficientes visuais.

Vanessa FajardoDo G1, em São Paulo

Maurício Almeida, de 18 anos, tem pressa. Nasceu aos 6 meses e foi para a incubadora, onde o ar descolou sua retina. Desde então, percebe apenas contornos e cores. A bengala o ajuda a se locomover. O jovem nunca estudou em escolas especiais, domina o braile, mas hoje o substituiu pelos softwares que leem textos no computador. Aprendeu inglês com jogos na internet, foi professor voluntário e, recentemente, foi aprovado para cursar ciência da computação na Universidade do Estado de Michigan, nos Estados Unidos. A estreia do passaporte será em agosto.


Maurício Almeida, de 18 anos, vai para a Universidade de Michigan em agosto (Foto: Vanessa Fajardo/G1)                                                                                                                                                           O garoto nem chegou a prestar vestibular no Brasil. Concluiu o ensino médio em uma escola americana com sede em São Paulo e nesse período decidiu que queria morar fora do país. Escolheu os Estados Unidos por acreditar que as universidades americanas têm mais estrutura para os deficientes visuais. A formação facilitou o ingresso. Para concorrer à vaga, Maurício não teve de fazer o teste de proficiência em inglês, o Toefl(Test of English as a Foreign Language), mas encarou o Scholastic Assessment Test (SAT, Teste de Avaliação Escolar), uma espécie de "Enem americano".

O estudante, que mora em São Paulo com o pai consultor, a mãe dona de casa e um irmão mais novo, nunca saiu do Brasil, mas diz estar tranquilo com a mudança para os Estados Unidos. Vai morar no campus da universidade. Não teme bullying, preconceito ou qualquer outro tipo de discriminação por conta da limitação visual. “Não fui criado como um ‘cego coitado’, por isso não sei o que é preconceito. Sempre me considerei normal e nunca fui rejeitado”, diz. Maurício não acredita que a deficiência tenha interferido no processo de seleção da universidade.

'Saio à noite, tomo uísque'
A deficiência nunca o limitou, e a tecnologia é uma grande aliada. Tanto que em fevereiro criou a própria empresa, que vende hospedagem de sites e rádios na internet. Também coordena a criação de um site que traduz do inglês para português jogos na internet para deficientes visuais que, segundo ele, são o único de entretenimento para este público. O notebook da Apple sempre o acompanha na mochila. Um software lhe permite ler e-mails, livros, acessar sites de notícias e escrever o que quiser. Houve um tempo em que o pai precisava escanear os livros para permitir o uso do software, hoje não mais. Para o celular, usa um aplicativo que reproduz os comandos e o som das teclas. Para provar a habilidade, Maurício digita rapidamente a mensagem ‘isso é um teste’ e encaminha para o celular da reportagem.

A deficiência faz você crescer, talvez se enxergasse não tivesse estímulo. Não iria selecionar meus amigos, por exemplo. Hoje só falo com gente que se gosta, que tem vontade de fazer algo diferente para si mesmo."

Maurício Almeida, de 18 anos

Quando questionado se tem uma vida normal de adolescente, Maurício não titubeia. “Claro que sim. Não deixo de fazer nada, saio à noite, tomo uísque, mas não fumo, não gosto de cigarro. Faço minhas farras”, afirma, enquanto devora um saquinho de pão de mel durante a conversa, que ocorreu em um café no Shopping Ibirapuera, em São Paulo. O jovem diz que, se pudesse enxergar, sua vida seria diferente, mas não necessariamente melhor. “A deficiência faz você crescer, talvez se enxergasse não tivesse estímulo. Não iria selecionar meus amigos, por exemplo. Hoje só falo com gente que se gosta, que tem vontade de fazer algo diferente para si mesmo.”

'A adaptação é minha'
Maurício aprendeu inglês jogando na internet durante a infância. Mais tarde, se tornou professor voluntário na escola americana onde cursou o ensino médio. Lá havia um programa para ensinar filhos de funcionários e familiares de alunos. Nunca estudou em escolas especiais. “Sou contra, acho um atraso porque eu tenho de me adaptar à sociedade, não o contrário. A sociedade tem de me dar estrutura, mas a adaptação é minha.”

Fã de história, política e economia, o futuro estudante de ciências da computação e ‘nerd’, como o próprio se intitula, diz que pretende se formar nos Estados Unidos e, ao término da graduação, voltar para o Brasil, mas sabe que os planos podem mudar. “Hoje gostaria de voltar, mas tenho plena consciência de que isto pode não acontecer e estou aberto.” Um sonho é ver a educação brasileira no padrão da americana para que os jovens não precisem deixar o país para estudar.

A notícia da aprovação da Universidade de Michigan chegou por e-mail em dezembro do ano passado. Para comemorar, Maurício abriu uma garrafa de champanhe e encaminhou o e-mail para o pai. Foi o presente de Natal da família. O custo, que inclui a mensalidade e gastos com alimentação e hospedagem, será de 44 mil dólares por ano (cerca de R$ 90 mil). Neste mês de julho, Maurício quer “ver gente, se encontrar com amigos e se despedir.” Tem pressa em viajar.